sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Começo de primavera


Os mais observadores podem ter deduzido, pela foto, que Michel Seikan deu as caras pelo parque no domingo, e vocês têm razão. Nada que um bom olhar e, certamente, uma boa câmera não possam fazer, como pode ser conferido no álbum de fotos improvisado do Zazen no Parque e no total dos álbuns da CZBF que contam, em sua maioria, de fotos dele.

O dia de sol brilhante rapidamente deu vez ao crepúsculo, e o frio desceu do céu claro, sem nuvens. Desta feita nem os mosquitinhos ousaram aparecer. Sentei-me em zazen ao som de New York, New York que uma bandinha - praticamente de sopro - tocava animadamente. Animados também estavam os passantes, e o som da banda e as palmas das pessoas me colocaram rapidamente em ritmo de quermesse.

Michel Seikan também é graduando em gestão ambiental e aproveitamos, depois do zazen - ao qual ele chegou atrasado, menos 10 no seu dharma score - para conversar um pouco sobre o parque. Diz ele que este parque ecológico, na verdade, tem menos de 30 anos em sua vegetação, e não é mata atlântica nativa; fez parte de um projeto de reflorestamento relativamente recente, porém mais velho do que eu.

Quem mora em Florianópolis talvez relembre da triste notícia pela qual o parque ficou mais lembrado: a queda de um eucalipto em cima de pai e filho, em um dia de ventania forte, em 1994. Depois disto o parque ficou praticamente abandonado durante sete anos, sendo reaberto somente em 2001. Atualmente o número de pessoas - adultos e crianças, pais e filhos, casais de namorados, adolescentes barulhentos - que visita o parque nos domingos mostra que tal tragédia é apenas uma lembrança, cada vez menos nítida.

(A probabilidade de um eucalipto cair em cima da sua cabeça, caro leitor, é muito pequena. E, para tranquilizar ainda mais, o dharma score nom ecziste: é melhor que você chegue na hora, mas se chegar com atraso somente sente-se ao meu lado.)

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

"Mente do Despertar"


Fulano, um amigo que começou a praticar zazen recentemente, com empolgação, perguntou-me sobre qual seria meu objetivo, ou o objetivo da CZBF, em fazer o zazen no parque.

A minha resposta foi "objetivo nenhum", mas não foi propositalmente uma "resposta zen", nem tampouco uma maneira enigmática de deixá-lo pensando sobre o zazen que não serve para nada. Foi somente uma forma de dizer: "a sua pergunta não se aplica, pois não se trata de objetivos".

É mais uma questão de motivação. Eu poderia rascunhar, certamente, alguns objetivos desta prática: as pessoas se familiarizando com alguém sentado em zazen, chamar a atenção, fazer propaganda da CZBF, mostrar às crianças que zazen não é estar morto ou perneta, e assim vai. Até pensei em sentar com uma plaquinha de papelão ao lado, com um slogan como "zazen é bom pra você", ou qualquer coisa, a la Deshimaru rōshi, como me contaram recentemente. Quem sabe.

(Sicrano, outro amigo, questionou: "não é você que diz que o zazen é bom para nada? Como pode botar uma plaquinha dizendo 'zazen é bom pra você'? É contraditório." Ora bolas, estou cercado de pessoas perguntadeiras :D E quem disse que o zazen não serve para nada foi Kōdō Sawaki rōshi, eu sou apenas um papagaio.)

A motivação, contudo, não necessita de explicitar um ou mais objetivos. É evidente que algumas pessoas podem sentir vontade de fazer zazen simplesmente vendo outra pessoa; não se pode menosprezar isto. No último domingo, sentado sozinho, ao me levantar ao término do zazen vejo uma senhorita sentada no banco, uns 10 metros ao lado, aparentemente meditando ou relaxando depois do seu cúper.

Além do mais, o parque é delicioso, com ou sem mosquitinhos. Ornitólogos ou amantes de passarinhos são especialmente convidados.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Começo de setembro

O zafu do João, que peguei emprestado - ele mora do lado do parque - está tentando pegar um pouco de sol, hoje, segunda-feira feriado. Sem muito sucesso.

Ontem, com um céu nublado e umas gotinhas esparsas, fui no parque somente para ver se alguém estava por lá. Logo ao sair, um raio risca o céu leitoso, perante o meu andar que fica, momentaneamente, periclitante. Tenho de lembrar das probabilidades de ser atingido por um raio (aproximadamente 1 por 200.000).

Não há ninguém me esperando, e os coelhinhos estão avidamente roendo os talos de couve. Olhando ao redor, decidi sentar um pouquinho, até a chuva engrossar. Algumas crianças teimosas ainda brincavam no balanço.

Meia hora depois passa, diante de mim, umas quatro ou cinco crianças e uma mulher. Eles vêm cochichando de longe, e eu sei que olham para mim. "Será que ele tá morto?" "Não, não tá, ele tá com os olhos abertos" "Mãe, o que ele tá fazendo?"

Fico sentado com a minha cara de zazen, o rosto relaxado que, justamente por isso, deve ficar com cara de bobo, com os dentes da frente aparecendo. As gotinhas caem nos cabelos, no zafu. A caravana vai pegar uma trilha, logo um pouco atrás de mim. Ainda dá para ouvir o último comentário, surpreso: "mãe, ele não tem perna, mãe! É verdade, ele não tem perna!"